Seridó

MPF recomenda novos estudos e audiências públicas para liberação do Complexo Eólico Chapecari, em Currais Novos e Acari

Foto: Getson Luiz/ Reprodução

Empreendimento pode prejudicar comunidades quilombolas e afetar áreas como o Cânion dos Apertados, que faz parte do Geoparque Seridó, recentemente reconhecido pela UNESCO.

O Ministério Público Federal (MPF), em Caicó (RN), emitiu recomendação, após análise de nota técnica elaborada pelo grupo Seridó Vivo, para que o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (IDEMA) abstenha-se de emitir licenças ambientais para o Complexo Eólico Chapecari “até serem ultimados os debates sobre os impactos” da obra, com novas audiências públicas.

Segundo a recomendação, o MPF “com o auxílio técnico do Grupo Seridó Vivo, está convencido dos significativos impactos socioambientais” originados pelo Complexo Eólico Chapecari, que pretende instalar 88 aerogeradores, distribuídos em 11 parques eólicos, em uma área de 386,5 hectares entre os municípios de Acari e Currais Novos, no Seridó Potiguar.

O empreendimento poderá impactar três comunidades quilombolas do sertão do Rio Grande do Norte, causar prejuízos ao patrimônio arqueológico, à fauna e flora locais e afetar o Cânion dos Apertados, monumento natural muito procurado para o turismo de natureza e aventura e eleito, em votação popular, como uma das 7 maravilhas do Rio Grande do Norte. Os Apertados são ainda um dos 21 geossítios integrantes do Geoparque Seridó, reconhecido em abril de 2022 pela Unesco como de relevância mundial.
A recomendação, assinada nesta terça-feira, 28 de março, pela procuradora Maria Clara Lucena Dutra de Almeida, pede ainda a complementação dos estudos de licenciamento e a criação de unidade de conservação como compensação pelo empreendimento.

A recomendação é um instrumento extrajudicial e não tem o poder de parar efetivamente o processo de licenciamento ou de impor obrigações ao IDEMA ou ao empreendedor. Caso os pedidos sejam ignorados, contudo, outras medidas podem ser tomadas, inclusive judiciais, por parte da Procuradoria da República em Caicó.
Novos estudos e audiências públicas
No texto, o MPF pede que novos avanços nas etapas do licenciamento ambiental da megaobra não sejam permitidos “até serem ultimados os debates sobre os impactos do citado empreendimento eólico, inclusive por meio de novas audiências públicas que permitam o efetivo diálogo com a população diretamente afetada e com estudiosos de notável conhecimento sobre a área atingida (a exemplo dos integrantes do Grupo Seridó Vivo)”.

Além disso, o texto também recomenda que o IDEMA exija do empreendedor correções e complementações no Estudo de Impacto Ambiental e no Relatório de Impacto Ambiental (conhecidos como EIA-RIMA), com ênfase na discussão sobre os povos e comunidades tradicionais. A poucos quilômetros do empreendimento encontram-se as comunidades quilombolas Negros do Riacho, em Currais Novos, e Sítio Saco dos Pereira, em Acari. Certificada recentemente, a comunidade quilombola Queimadas, em Currais Novos, também poderia ser afetada.

Por fim, é recomendado que o IDEMA garanta, com recursos provenientes da compensação ambiental da obra, a criação de uma unidade de conservação no Seridó potiguar, devendo antes promover amplo debate com as comunidades envolvidas e com estudiosos que “contribuam efetivamente para o tema”, diz o texto, citando como exemplo os integrantes do Grupo Seridó Vivo.

Avanço dos empreendimentos eólicos
É a segunda vez que o Ministério Público Federal em Caicó emite recomendações ao IDEMA para suspender processos de licenciamento de eólicas após alertas emitidos pelos cientistas e ambientalistas do grupo Seridó Vivo. Em 2022, o Complexo Eólico Ventos de Santo Eduardo foi alvo de recomendação do MPF que, após nota técnica do Seridó Vivo, pediu ao IDEMA a suspensão de emissão de novas licenças para o empreendimento até que novos estudos fossem feitos.


O modo como as eólicas têm avançado sobre os sertões do Rio Grande do Norte e Paraíba é alvo de críticas por parte de grupos da sociedade civil, como o Seridó Vivo, que já analisou e apontou falhas e necessidades de complementações nos estudos de cinco empreendimentos. Incompletos, os levantamentos apresentados pelas empresas têm omitido diversas espécies animais, algumas inclusive em risco de extinção, assim como deixado de cumprir os protocolos de escuta e anuência de povos e comunidades tradicionais, e ignorado o rico patrimônio arqueológico da região.