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Tecnologia 5G promete revolucionar experiência em transmissões esportivas

Não há torcedor que não tenha se sentido frustrado por não conseguir comprar ingressos para aquela decisão tão esperada, seja ela qual for. Ou, então, aquela pessoa que está no estádio de futebol, mas não sabe dizer se o pênalti dado e validado pelo VAR (árbitro de vídeo) foi, de fato, bem marcado. Esses são sentimentos que fazem parte da rotina de quem consome esporte hoje. As tecnologias que vêm por aí, contudo, apontam para um futuro em que essas frustrações ficarão no passado.

Com a pulverização e o incremento do 5G, a 5ª geração de internet móvel, por parte de emissoras e produtoras de conteúdo e de telecomunicação, as transmissões esportivas e seu consumo devem mudar radicalmente. Dentro dessas possibilidades, será possível assistir aos jogos de casa como se estivesse em campo ou arquibancada, saber se um lance duvidoso foi bem marcado ou não. Inovações que, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, podem ser implementadas em alguns anos com a consolidação do 5G.

O QUE É O 5G?

Em linhas gerais, o 5G é a quinta geração de redes de celulares, que é especificada por um conjunto de padrões que definem as frequências e os protocolos de comunicação para que dispositivos (smartphones) e infraestrutura (antenas) consigam se entender. “Uma vez especificados esses padrões, fabricantes de dispositivos conseguem produzir aparelhos compatíveis com a tecnologia, permitindo que as redes de celular sejam implantadas e os dispositivos de diversos fabricantes acessem essa rede usando a tecnologia 5G”, explica o professor do Instituto de Computação da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Luiz Bittencourt.

Mas é na forma como funcionará que a nova rede costuma ser apresentada e compreendida. O 5G é reconhecido por três principais características: ser ultraveloz (pode ser 10 a 30 vezes mais rápida do que a rede 4G); a baixa latência, que corresponde ao tempo de resposta que o dispositivo apresenta para se conectar à rede; e a alta capacidade de processamento e transmissão de dados – que metaforicamente pode ser associado ao aumento da largura de uma estrada que permite maior quantidade de tráfego.

A partir desses três pilares, as transmissões esportivas e, por consequência, a forma como os espectadores consomem o esporte tendem a mudar drasticamente comparado ao que é hoje. Segundo especialistas, o 5G terá a capacidade de proporcionar muito mais do que uma transmissão estável ou sem delays (atrasos). O tempo de tudo será real. Em geral, experiências imersivas geradas pela tecnologia de Realidade Virtual (RV) e Realidade Aumentada (RA), além do aumento da customização do próprio consumo (assistir como eu quero e da forma como quero), estarão no cardápio de degustação oferecido pela rede.

SATÉLITE X 5G

Para entender como o 5G vai transformar a forma de transmitir e consumir esporte é necessário entender o funcionamento desse processo atualmente. Utilizando o esporte mais popular do mundo como exemplo, Ricardo Souto, Head de Transmissão da LiveMode, startup responsável que realiza a transmissão e comercialização de direitos dos jogos do Campeonato Paulista e da Copa do Nordeste, afirma que o processo de produção de partidas de futebol no Brasil ainda é dependente de uma tecnologia que não está veiculada à internet. Precisa de satélites.

“A produção dos eventos esportivos”, explica Souto, “é feita via satélite”. Ou seja: “Câmeras são instaladas na beira do campo, transformando o ambiente em um grande estúdio. Os sinais dessas imagens são levados até uma unidade móvel, que recebe e sobe esses sinais para um satélite em órbita. Do satélite, as imagens são enviadas de volta às emissoras que detêm os direitos de transmissão, que chegam à casa das pessoas por meio dos aparelhos”, explica.

No atual sistema resumido por Souto, os satélites não permitem a chegada de uma alta quantidade de sinais vindo das câmeras, o que limita a transmissão dos dados e o fluxo das informações.

“É um gargalo de distribuição de imagens.” Como uma estrada engarrafada. Isso faz com que os espectadores assistam às partidas em um sequenciamento único de imagens. Isto é: enquadramento no treinador, que segue para a imagem do campo, que fecha na torcida. No 5G, isso muda: as pessoas terão autonomia para escolher as imagens. “Essa é a primeira coisa que chamou a atenção da gente com o 5G, porque essa tecnologia acaba com o gargalo. Você passa a ter uma internet mais rápida, disponível e ampla, capaz de tirar mais sinais disponíveis do estádio”, diz Souto.

A nova rede, com capacidade de transmitir mais dados, permite que as produtoras sejam mais criativas na forma de trabalhar o conteúdo. Fica viável, por exemplo, instalar uma microcâmera no juiz e dar ao espectador a opção de assistir ao jogo pelo ponto de vista deste personagem, de dentro do campo.

“Essas possibilidades vão surgindo conforme se vai aumentando a transmissão de mais dados para além daquela imagem vertical e horizontal bidimensional que a gente vê em um jogo”, afirma Bruno Maia, professor de marketing da PUC-Rio e fundador e CEO da Feel the Match, startup que desenvolve negócios e propriedades de conteúdos ao esporte. “Quando o 5G começar a ser testado, vão se criar milhões de possibilidades de interações. Você pode, com muito mais facilidade, ter uma transmissão em que o espectador escolhe três formas diferentes de assistir ao mesmo jogo de futebol, por exemplo”, salienta Maia.

CUSTOMIZAÇÃO

“Interação” e “escolha” são duas palavras ditas por Bruno Maia que vão ao encontro das capacidades do 5G e podem vir a ser rotina para os torcedores em um futuro próximo. Como as produtoras de conteúdo vão desfrutar de tecnologia mais rápida e que gera capacidade para suportar uma quantidade alta de dados, as produções de conteúdos tendem a ser mais inovadoras do que apenas o aumento da disponibilidade de imagens.

A primeira novidade, como mencionado, é a quebra do gargalo que viabiliza a transmissão simultânea de imagens e permite que o espectador escolha como deseja assistir à partida – seja pela perspectiva de um atleta ou pela movimentação dele em campo, de um canto do estádio ou do meio do gramado. As opções estarão disponíveis como se fossem um cardápio.

Contudo, há também o possível desenvolvimento de novas ferramentas interativas que podem ampliar essa customização e transformar a forma como se consome o evento esportivo. O 5G vai permitir que as pessoas consigam, por meio do uso de um óculos de realidade virtual, assistir a um jogo de casa e se sentam como se elas estivessem dentro do estádio ou, até mesmo, no gramado – uma prática já adotada pela NBA.

“É possível posicionar uma câmera perto do banco de reservas e fazer o torcedor assistir a uma partida desse ângulo”, diz Ricardo Souto, head da LiveMode. “Então, o 5G tem um potencial de promover experiências altas aos consumidores”, reforça. Bruno Maia pensa em outras inovações: “Hoje a gente consegue reproduzir a imagem e o som por meio da realidade virtual. Eu não sei se daqui a alguns anos vamos conseguir reproduzir o cheiro também das coisas”, provoca.

MAIS INFORMAÇÕES

Outra funcionalidade que pode ser aplicada pelo 5G é o de produção e disponibilidade de informações e conteúdo em tempo real. Poderá ser possível apontar para um jogador com a câmera do smartphone e extrair dados, estatísticas ou qualquer outra informação dele, como distância, velocidade percorrida ou frequência de batimentos cardíacos. “Imagina que legal seria poder ver os batimentos cardíacos de um jogador e do goleiro no momento de uma cobrança de pênalti”, exemplifica Souto.

Ambos, contudo, reforçam que essas criações ainda estão no plano das ideias e que poucas experimentações no mundo ainda foram feitas. A fase é de testes e de descobrimentos, de saber se funciona ou não, de descobrir limites ou ignorá-los. Mas, entre os especialistas ouvidos pelo Estadão, não há dúvidas: o 5G vai transformar a forma como se produz, transmite e consome esporte. Como? Não se sabe.

Na Alemanha, uma maneira de se apropriar do 5G está sendo praticada há meses. No Campeonato Alemão, torcedores que assistem aos jogos in loco em determinados estádios já conseguem usufruir da funcionalidade de replay instantâneo. Portanto, um gol ou uma jogada duvidosa pode ser conferido no celular instantes após o lance ter acontecido.

A NBA já testou a tecnologia de realidade virtual, permitindo que torcedores, de casa, acompanhassem uma partida como se estivessem dentro do ginásio.

OUTROS IMPACTOS

Porém, são experimentos que dificilmente devem chegar ao Brasil em 2022. Diferentemente da Alemanha e dos Estados Unidos, que já adotaram o 5G e possuem estádios e arenas com infraestrutura capaz de fazer a rede funcionar, o País ainda dá os primeiros passos para o uso da quinta geração da rede.

No fim do ano passado, foi realizado o leilão, entre as operadoras, para a concessão da exploração de faixas de frequência do 5G distribuídas no Brasil. Hoje, parte das capitais e algumas cidades brasileiras já estão aptas a receber a 5ª geração de internet móvel. Espera-se que, quando chegar de vez ao País, isso venha a gerar transformações tanto do ponto de vista de transmissão quanto comercial.

De acordo com holandês Jan Kees Moss, analista de investimentos e mestre em gestão esportiva internacional, o 5G vai ajudar a tornar as transmissões mais flexíveis e baratas para as empresas. “Como a infraestrutura será mais flexível, mais conteúdo poderá ser produzido, sendo positivo para as receitas. Do lado do custo, também há benefícios, pois as câmeras 5G não exigem cabos, enquanto as produções podem ser enviadas diretamente para um hub central. Satélites e caminhões não serão mais necessários”, escreveu Moss no blog “Sporttomorrow”, dedicado a falar sobre inovação esportiva.

Ele afirma que essas melhorias podem aumentar a quantidade de concorrentes na transmissão das partidas. Ricardo Souto entende que a possibilidade de maior geração de imagens e conteúdos pode ser melhor aproveitada comercialmente pelas empresas. “As marcas vão poder oferecer câmeras exclusivas e comercializar essas imagens com os consumidores. Então, o 5G vai trazer também um significativo impacto comercial no esporte”, acredita. As informações são do Estadão Conteúdo.