A arquiteta e urbanista Karisa Lorena Carmo Barbosa, que teve trechos da sua dissertação de mestrado plagiadas em ao menos 13 páginas pela interventora da Ufersa, Ludimilla Oliveira, demorou quatro anos para concluir a obra original de 247 páginas. A profissional também teve que produzir os chamados dados primários sobre a história urbanística de Mossoró, traçando informações de 234 anos que descrevem o crescimento da zona urbana da cidade do interior.
Tudo isso, conta Karisa, foi executado sem nenhuma remuneração, já que ela não recebia bolsa para produzir a pesquisa. O trabalho foi apresentado no Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFRN, com o título “O processo de urbanização da cidade de Mossoró: Dos processos históricos à estrutura urbana atual”.
“Eu peguei desde o período colonial, desde quando era uma comunidade ao longo do Rio Mossoró, com fazendas de gado, passando pela criação da Freguesia, depois da Vila, para chegar à cidade, mostrando o crescimento da zona urbana ao longo desses períodos”, diz a docente.
“O objetivo principal da pesquisa foi a conexão da expansão urbana com os ciclos econômicos da cidade. Eu detectei cinco ciclos econômicos do período colonial até os dias atuais, onde cada período tem uma forma de se expandir, e o trabalho maior que teve foi que eu coletei todos os mapas que na época não eram digitalizados. Eu peguei os mapas da Caern, da Prefeitura, IBGE, de diversos órgãos que eram todos físicos, e digitalizei no Autocad”, lembra.
O trabalho foi tanto, diz a docente, que as pessoas brincavam afirmando que ela “queimou um cartucho” ao fazer um trabalho equivalente a uma tese de doutorado ainda no mestrado. Ela se vê orgulhosa com o produto.
“Como tava faltando aqui em Mossoró muita informação documentada, foi bom porque essa dissertação depois virou um livro, foram publicadas três mil unidades, e serviu de base para muitos estudantes de história, geografia, arquitetura, gestão ambiental, engenharia, de muitas áreas que até hoje em Mossoró utilizam meu livro como referência para apoio de estudo histórico da cidade”, afirma.
Desde 2005, Karisa é professora efetiva do IFRN Campus Mossoró, tendo também atuado no instituto como substituta entre 2001 e 2003. Ainda passou pela coordenação do curso de Arquitetura e Urbanismo na UnP e teve escritório de arquitetura. Desde 2021, está com o doutorado em andamento na UFRN. Na instituição em Natal, ela pretende atualizar a produção do mestrado, mas agora sobre outro olhar:
“Pretendo realmente atualizar, só que agora vou fazer num viés ambiental, pegando mais a questão urbano ambiental de Mossoró.”
Plágio
O caso de plágio do trabalho de Karisa pela interventora da Ufersa, Ludimilla Oliveira, foi revelado com exclusividade pela agência Saiba Mais em 2020. A tese de doutorado da interventora tem 16 páginas plagiadas de outras obras, sendo 13 advindas da produção intelectual de Barbosa. Neste mês, a UFRN cassou o título de doutorado da reitora após a constatação do plágio.
Segundo Karisa, pela densidade da sua pesquisa, é comum que seu trabalho seja utilizado por outros estudantes, mas sempre referenciado. A descoberta do plágio foi uma surpresa.
“Por estar bastante divulgado na internet, em sebo virtual, em cópia física em livraria ou no próprio repositório da UFRN, era comum que estudantes, colegas, me procurassem para tirar dúvidas. Então as pessoas ou tiram da internet ou ligam pra mim, tiram dúvida, pedem mapa, pedem alguma coisa, mas referenciam”, diz.
Ao ficar sabendo da infração, ela afirma que a primeira reação foi nem acreditar, mas quando depois percebeu que realmente se tratava de uma tese com trechos copiados indevidamente.
“[Ela] poderia realmente ter consultado, ter conversado, ter referenciado, porque hoje eu sou professora, sou orientadora, também sou aluna, e eu sei como é importante na Academia a gente reconhecer, fazer a pesquisa responsável. Hoje a gente tem todo o conhecimento do mundo à disposição pela internet ou em bibliotecas presenciais ou virtuais, mas a gente precisa realmente valorizar a pesquisa”, aponta Barbosa.
Para concluir a dissertação, a professora do IFRN levantou dados primários, aqueles originais e coletados pela primeira vez
“Você tem que tirar conhecimento de onde não existe, sair nas casas, levantando mapa antigo, pegando mapa de praça no IBGE, na Caern, passando meses para digitalizar aquilo. Realmente é um trabalho muito oneroso que o mínimo que a gente merece como acadêmico, como aluno, como professor, é ter o reconhecimento”, afirma.
Na sua própria pesquisa, Barbosa disse que utilizou dezenas de citações.
“Todas estão lá, tanto de títulos muito antigos que eu peguei em biblioteca de Mossoró, nas traças, cópia única, com uns até escrito na mão, como de títulos captados na internet, de forma virtual, por pesquisadores mais contemporâneos, mas é importante fazer essa referência porque só quem tá na Academia sabe como é relevante e dispendioso fazer pesquisa no Brasil”, crava.
Agência Saiba Mais