Repórter
Entre Natal e Parnamirim é possível viajar pela história, especialmente no tocante à participação singular da capital potiguar na Segunda Guerra Mundial. A história aconteceu aqui e até há espaços que contam ou que testemunharam os acontecimentos de um dos momentos mais importantes da história recente. Contudo, a história para o povo aprender e para o turista ver, passa despercebida. Apesar de iniciativas para implementar um roteiro histórico turístico, como o projetoelaborado pelo Sebrae-RN para desenvolver uma série de atividades econômicas dentro da cadeia do turismo, falta estrutura e organização para receber visitantes interessados em conhecê-la.
No final de 2019 o Sebrae/RN lançou o “Parnamirim Field na Segunda Guerra”, estudo que mapeou as potencialidades desse tema, num roteiro que reúne prédios, equipamentos públicos e fatos marcantes. “A gente realizou visitas técnicas com as agências de turismo e guias e acho que é o momento da gente retomar, porque o Complexo da Rampa só foi entregue esse ano”, diz o gestor de turismo do Sebrae, Yves Guerra.
O roteiro fica entre a base área de Parnamirim, que foi estruturada à época pelos Estados Unidos, e a histórica Rampa, que está sendo transformada em museu. No caminho estão, ainda a maternidade Januário Cicco, a Base Naval de Natal e o Grande Hotel, na Ribeira.
Para Yves, a implementação desse roteiro é uma alternativa a ao turismo de sol e mar, de modo a desenvolver uma cadeia de atividades que gerem emprego e renda. “Há uma história que poderia ser melhor explorada pelo mercado e pelo poder público. Agências que queiram se especializar no turismo histórico já têm um produto pronto que pode desenvolver a cadeia produtiva”, sugere.
Desse projeto também foi desenvolvida uma websérie, que conta, em 10 capítulos curtos, um pouco dessa história da participação de Natal e Parnamirim na Segunda Guerra Mundial. Todo esse conteúdo tá disponível no portal que ainda é mantido pelo Sebrae: o segundaguerra.com.br.
Para os operadores de turismo, a falta de infraestrutura para receber visitantes, sejam eles locais ou turistas, compromete a execução de um roteiro histórico a ser oferecido, mas que, se isso se concretizasse, fortaleceria a cultura local e a identificação do povo com a própria história.
“Ainda falta infraestrutura que permita a fluidez da atividade turística envolvendo desde vans a ônibus de grande porte. Além disso, o turista se beneficia da estrutura criada para a população, portanto devemos lembrar que se o patrimônio não está adequado para a população, igualmente não será apreciado pelo turista”, pontua Decca Bolonha, diretora da Potiguar Turismo Receptivos.
Ela explica que um roteiro turístico contribui na padronização do produto histórico a ser oferecido ao cliente. Sendo assim, os receptivos iriam se utilizar do mesmo roteiro com apoio do poder público no que condiz ao suporte de trânsito, segurança e urbanização.
Decca destaca ainda que seria possível atrair mais turistas a partir de um trabalho engajado com o potencial histórico cultural, alinhado com as operadoras que vendem o destino, com os receptivos e poder público. “Isto posto, entendo que o produto após homologado deva ser amplamente promocionado em todos os veículos de mídia e marketing, movimentando a economia local”, avalia.
Parcerias
O diretor da Luck Receptivo, George Costa, diz que reconhece o potencial histórico da capital, a começar pela Fortaleza dos Reis Magos e pela participação na Segunda Guerra Mundial, representada pelo Complexo da Rampa. “O que falta para acontecer é que o Governo do Estado entenda que esses dois equipamentos, sejam tocados pela iniciativa privada, através de uma concessão. Só assim eu entendo que o potencial vai ser explorado de forma integral”, sugere.
Mas para integrar um roteiro histórico, George também frisa a necessidade de ter infraestrutura adequada. “Praças melhor cuidadas, calçadas, áreas de convivência. A Ribeira precisa de uma reformulação completa, onde as pessoas de Natal também circulem e convivam. Esse contato com a cultura local precisa ser feito de forma natural”, acrescenta.
Os empresários do segmento explicam que o turista se apaixona e quer voltar quando conhece a história do lugar, pois se envolve mais. “Temos muitos roteiros históricos, mas eles não podem ser contados porque a cidade não tem estrutura para receber os turistas. O Museu da Rampa, poderia ter uma programação cultural, feirinha de artesanato e agricultura familiar com degustação para a população freqüentar, primeiramente, e o turista não ter a sensação de abandono”, destaca Jarbiana Costa, diretora da Anauê Receptivo.
Falta de divulgação atrapalha o turismo
Termos de cooperação com as prefeituras de Natal e Parnamirim foram firmados, além do Governo do Estado ter feito um investimento no Complexo da Rampa, mas, na prática, ainda não foi possível ser executado.
O roteiro elaborado pelo Sebrae termina no Centro Cultural Trampolim da Vitória, em Parnamirim, que conta a história da presença norte-americana em Natal/Parnamirim com a Segunda Guerra Mundial. Um acervo com fotos originais, painéis, equipamentos, documentos, veículos e objetos da época levam o visitante a um verdadeiro encontro com a história. Contudo, o espaço é mais utilizado para o turismo pedagógico com escolas locais e de outras cidades.
A diretora administrativa do Centro, Rosa Gonçalves, explica que os turistas comerciais acabam não conhecendo o equipamento e a história que tem para contar. “A gente pode falar que falta um pouco mais de divulgação, sim. Para grupos de turistas, precisa ter uma estrutura para recebê-los, por isso estamos elaborando projetos com novos espaços, com praça de alimentação, feirinha de artesanato, por exemplo”, conta a diretora.
Os recursos para manter o equipamento vem apenas do orçamento do município. A demanda de turistas comerciais é espontânea, com raras excursões promovidas por agências de turismo. O centro funciona de quarta a domingo, inclusive nos finais de semana, das 9h às 16h com entrada gratuita. O canal para agendamentos é pelo e-mail [email protected] para a visita guiada.
Em Natal, a secretária Adjunta de Turismo, Cristiane Alecrim diz que o Município mantém o diálogo com o Sebrae para viabilizar o roteiro histórico e deve participar com os serviços de sua responsabilidade e na divulgação. “Os principais pontos do roteiro não são do município, então a gente não tem como fazer nada em relação, por exemplo, à Rampa, que é do Governo do Estado”, explicou.
De fato, todos os equipamentos do roteiro são administrados pelo Estado, Município de Parnamirim, Universidade Federal (UFRN) ou proprietários particulares. “A Secretaria de Turismo deve começar a divulgar em alguns canais sobre isso. Mas a gente precisa primeiro tentar também mapear, recomeçar, porque, alguns pontos de visitação não são acessíveis pelo município”, disse ela.
A TRIBUNA DO NORTE procurou a Secretaria Estadual de Turismo mas a entrevista solicitada não foi viabilizada até o fechamento desta reportagem.
“City tour” no Centro Histórico não vingou
Num passado próximo, antes da pandemia da covid-19, os turistas até tinham a opção de conhecer a história da cidade, mas essa falta de atenção apontada por Yves fez a iniciativa não vingar.
Jarbiana Costa, diz que sua empresa, a Anauê Receptivo, passou a oferecer um city tour pelo Centro Histórico de Natal. Isso foi em 2018. Mas esbarrou em algumas dificuldades. Era preciso que a companhia de limpeza urbana garantisse a limpeza das ruas cedo. “Mas era muito complicado, principalmente em finais de semana e feriados. Muito lixo espalhado pelas ruas e fedor de urina”, conta.
Outra questão é a segurança, apesar de ter recebido apoio do 1º Batalhão da Polícia Militar. “O problema é a sensação de insegurança com as pessoas em situação de rua seguindo os turistas, pedindo dinheiro, interrompendo o guia e fazendo xingamentos. Depois da pandemia, aumentou muito o número de moradores de rua e desistimos”, explica Jarbiana Costa.
Outras dificuldades eram as igrejas fechadas ou sem pessoas responsáveis para fazer o acolhimento, além das praças históricas mal conservadas. Apesar disso, Jarbiana diz que os comerciantes do Beco da Lama apoiavam a iniciativa. “A gente incentivava os turistas a comerem da ‘gastronomia popular’ e os restaurantes e barzinhos faziam pequenas porções de picado, caldinho de mocotó, cachaça, banca de ervas. Os turistas tiravam muitas fotos nos painéis do Beco da Lama, onde finalizávamos a caminhada”, conta a empresária.
Tribuna do Norte